sábado, 1 de dezembro de 2007

INTERESSE POUCO É BOBAGEM


Três moças em suas respectivas bicicletas estavam sendo seguidas por um senhor de chapéu em sua imponente pick-up cabine dupla. Ele chegou próximo a elas e buzinou. O engraçado nisso tudo foi vê-las improvisar uma reação de susto quando na verdade já esperavam por aquilo. Elas falaram qualquer bobagem sorrindo e o senhor respondeu com uma acelerada seguida de uma risada “sou o máximo”. As moças não tinham rostos bonitos e muito menos corpos atraentes. Mas aquele senhor que aparentava ter mais de 60 anos não podia abrir mão do seu poder de “sedução”. Não pude ver no que se sucedeu aquela paquera entre gerações diferentes, pois segui caminhando. Mas não é preciso muita imaginação para deduzir em que resultou aquilo. Peguei-me pensando: Se tivesse uma pick-up tão atraente, eu a usaria para atrair a atenção de mulheres mais belas e menos óbvias. Sim, que tivessem curvas mais bem definidas, sorriso completo e olhassem para mim e para a pick-up como um conjunto, e não apenas para a pick-up como se pick-up estivesse a fim delas. São no mínimo curiosas as desculpas que as pessoas dão para tentar justificar quando está evidente que agiu por interesses. Mulheres belas com homens feios, porém ricos, sempre tem a desculpa para qualquer indagação sobre o seu “amor”: “Os olhos dele são lindos.”, “Eu acho o cotovelo dele um charme!”, “Tá, ele não é muito bonito, mas me trata tão bem, é tão bonzinho que a beleza interior dele transcende”, “O dinheiro dele pouco importa, se não o amasse, jamais estaria com ele. Amor acima de tudo. O que foi, porque você está me olhando desse jeito?”, “Ok, confesso que no início era apenas por interesse, mas ao longo do tempo, acabei me apaixonando por ele e hoje tenho o útil unido ao agradável.”, e por aí vai... O difícil é ouvir tudo isso e ficar quieto. Eu acredito que quem se vende, jamais poderá sentir-se feliz. Para usufruir do dinheiro de outra pessoa, você terá que levá-la de brinde (a não ser que você anuncie o assalto logo de cara), logo não poderá gastar o dinheiro da forma que bem entender. Terá que fingir na mesa, no banho e sacrificar-se na cama. Mentiras sempre são insustentáveis, apenas algumas custam mais a cair por terra do que as outras. Bom, a não ser que você saiba mentir de uma forma que convença até a si mesmo. Neste caso, procure um médico e vá contar suas mentiras a ele.

Nada substitui a segurança de dizer que: O que tenho, é meu de fato. Não de uma forma mesquinha, mas sim sabendo valorizar o real valor dos seus esforços. Viver na condicional não deve ser muito agradável.

E essa coisa de interesses não se limita apenas aos relacionamentos amorosos, vai além, muito mais além. E todos nós sabemos disso.

Eu estava na fila de uma casa lotérica para pagar uma conta. A fila estava enorme. Eis que surge uma moça bonita, bem vestida e vai para o final da fila. Mas isso foi por alguns minutos, bem lá na frente ela viu uma outra moça que conhecia e parou ao lado dela. Não tão bem trajada, humilde e comportamento tímido notava-se sua surpresa pela consideração e felicidade da outra por estar ali tão comunicativa e prestando atenção em cada palavra que ela dizia. A fila começa a andar e as duas caminham lado a lado, até que a “simpática” com um sorriso cínico diz que vai ficar por ali mesmo, pois a fila havia crescido e nem se lembrava mais qual era o seu lugar e ressaltando a falsa felicidade por tê-la encontrado é atendida rapidamente e despede-se da amiga com um tchau não tão cordial quanto à abordagem. O mais interessante nisso tudo, é que muitas pessoas na fila notavam o mesmo que eu, menos a moça generosa.

Eu não entendo o porquê as pessoas fazem tantos rodeios para pedir um favor. Por mais intimidade que possa existir entre elas, o rodeio é praticamente inevitável. Prepara-se o terreno para deixar o outro a vontade da seguinte maneira:

1º - demonstra interesse pelo estado da pessoa. Como ela está. Se aquele problema se resolveu. Como está a família (do mais novo ao mais velho). Se a suspeita de Leishmaniose do seu cão se confirmou, etc.;

2 º - faz questão de ressaltar o quanto o quer bem e que estará disponível para o que precisar;

3 º - fala sobre o drama que está enfrentando no momento com ênfase no ponto que será o pedido;

4º - com a voz num tom baixo, doce e praticamente pedindo misericórdia, pede-se o favor.

Caso a resposta seja positiva, o interessado agradece de forma exaustiva como se não existisse pessoa melhor no mundo (e naquele momento não há mesmo). Agora, se ouvir um não, um buraco no chão se abre e, imediatamente o sentimento de frustração soma-se a um ódio repentino. Mentalmente o interessado começa a praguejar: Tomara que você se dê mal em tudo que faça! Bem feito que aquele cachorro babão morreu de leishmaniose, tomara que você também esteja! Agora entendo porque a sua família não o trata muito bem, um avarento é tem mais que ser isolado mesmo. Desejado mentalmente o mal, o interessado se despede com um sorriso amarelo e dizendo que entende perfeitamente o porquê do outro não poder ajudá-lo naquele momento, diz que está tudo bem.

E quando não se tem coragem de pedir pessoalmente e manda outra pessoa pedir no seu lugar? Provavelmente é pior. Uma situação que diz respeito ao seu interesse, e você não estará lá para argumentar, ficará a cargo do outro. Se a maioria das pessoas tem vergonha de pedir favores em seus nomes, o que dirá em relação em nomes dos outros? A pessoa incumbida de pedir o favor, não terá o mesmo desempenho que só você teria (a não ser que seja algo do interesse dela também). Ela chegará, pedirá de forma acanhada procurando ser o mais breve possível para ver-se livre daquela incumbência.

Caso a resposta seja sim, o alívio é imediato. Sendo a resposta não, você terá que praguejar contra duas pessoas.

E por falar em pedir em nome dos outros, o que dizer das moças que ligam para nossas casas pedindo contribuição para instituições filantrópicas e afins? Estas sim, são exemplos de persuasão e determinação. Pedem pra falar com o responsável, caso você diga que não é o responsável, não tem problema, ela conta uma historia que ninguém quer ouvir do mesmo jeito. A voz angelical, as palavras ditas numa seqüência que não abre espaço para você falar, expõe ali uma triste e ao mesmo tempo linda estória de amor de quem poderia estar roubando, matando ou se prostituindo, mas não, está ali engajado em salvar o próximo, fechando o texto com gerúndio, diminutivo e súplica: “Senhor, poderíamos estar contando com a sua contribuição mensal de apenas dez “reaizinhos”? É muito importante para as nossas crianças.” Quando você diz que não vai ajudar, o tom de voz muda, a beleza da caridade se expira e desligam o telefone como se tivesse acabado de falar com a própria encarnação do demônio. Algumas chegam a questionar antes de desligarem, o porquê do seu não. Aí você explica que no momento não está em condições ou que já ajuda uma instituição que é da sua cidade etc. Aí, fica um clima de que só terá salvação quem ajudar a instituição que vos fala momento. Você acha que ela desistiu? Não, ela vai logo deixando bem claro que não tem por onde fugir. Diz que entende e que no mês que vem quem sabe as coisas estejam melhores pra você e possa de fato contribuir.

Numa tarde qualquer do mês seguinte, o seu telefone toca. Advinha quem é? Pois é...

“Boa tarde. Eu gostaria de estar falando com o responsável pela residência...”

Um dia eu gostaria muito de assistir o treinamento desse pessoal. Tenho certeza que num dado momento eles são orientados assim: Ajam como se estivessem diante do Criador no dia do juízo final, ou seja, peçam por misericórdia em nome de nossas criancinhas.

Eu não tenho nada contra esse tipo de trabalho, acho que temos que ajudar mesmo, mas com três condições: De coração aberto, sem visarmos recompensa por isso e o mais importante, sem pressão. A ladainha é o que mata a boa vontade das pessoas.

Ainda nessa de pedidos e interesses, tem coisa mais interesseira do que criança?

Sim, crianças são mercenárias e corruptíveis. De uma forma inocente, mas são. Temos que educa-las para que deixem isso de lado o quanto antes, se não, quando crescerem terá grandes chances de entrarem no cenário político (que fique claro que eu acredito na honestidade de uma minoria política).

Um exemplo simples da manipulação humana por conta de seus interesses na infância, é o fato de uma criança surgir diante de outra criança com um brinquedo diferente ou uma guloseima qualquer. A partir daquele instante, a criança interessada começa a criar vários mecanismos para ter acesso ao objeto de desejo.

Vamos aos mecanismos:

1 º - olha seguidas vezes para o objeto de desejo e para o rosto do seu proprietário;

2 º - aproxima-se puxando assunto e tentando disfarçar o interesse;

3 º - se o outro não se manifestar, o interessado procura comentar sobre objeto de desejo aguardando para que lhe seja ofertado;

4º - uma vez conseguido acessar o objeto de desejo, o interessado não irá se contentar com pouco, se não tiver nada para ofertar ali no momento como troca, vai-se levando o outro na conversa até tirar o máximo de proveito.

Há crianças que não são dadas a criar mecanismos para se alcançar o objeto de desejo, talvez porque não são boas estrategistas ou por falta de paciência mesmo. Neste caso, vão lá, arrancam o objeto de desejo das mãos da outra criança, tentam se evadirem do local do “crime” e quando são pegas, repreendidas e em tempo devolverem o objeto causador da discórdia, inicia-se ali um campo de batalha. A criança age como se ela estivesse sendo lesada ao ter que devolver o que não lhe pertencia. Sim, não lhe pertencia, mas agora que está em seu poder, pertence!

Os pais devem atentar muito para essa questão. Se não orientada corretamente, a criança corre o sério risco de repetir esse ato aos 10, 20, 30, 40 anos...

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